O líder do governo no Congresso Nacional, o Deputado Ricardo Barros, se manifesta na CNN dizendo que “Só o professor não quer trabalhar na pandemia”, notadamente quer agradar seu “chefe” e, quem sabe, garantir de forma integral os repasses das suas emendas parlamentares para atender seu reduto eleitoral no Paraná e garantir o seu sétimo mandato. Em 2020 foram mais de 4 milhões de reais.
Seriamente, não dá para concordar com esse descabido posicionamento do líder do governo Bolsonaro.
Professores trabalham muito mais nessa pandemia. Nela reinventaram suas práticas docentes adequando-as a realidade das ‘aulas virtuais’. O novo planejamento exigiu novos conhecimentos tecnológicos e acrescentou ações de docência fora da rotina das aulas presenciais. Contrário da retórica do nobre deputado paranaense. O nobre congressista nem desconfia o quanto acrescentou e impactou no dia a dia dos professores, apesar de ter a obrigação de saber, diante de sua representatividade como deputado.
Estudo apontou maior incidência de contaminação da doença entre professores de quase o triplo (2,92 vezes) do que registrado na população de 25 a 59 anos no estado de São Paulo. No vai e vem de abre e fecha escolas ocorreram 73 óbitos por Covid. Em 1.834 escolas paulistas foram identificados 2.383 casos de contaminações entre alunos e professores. Na capital paulista, até o dia 5 de abril, foram 13 óbitos na rede municipal de ensino e 812 casos registrados. Essa realidade deve se repetir em outros estados e cidades brasileiras.
Reabrir as escolas enquanto perdurar a pandemia e sem a vacinação é ‘brincar com o perigo’. Claro que não afetará o nobre congressista, mas os professores, os funcionários, os alunos e os seus familiares. Pimenta no olho do outro é colírio, diria minha avó.
Importante ressaltar que a Câmara de Deputados também estão com suas sessões de forma virtual, desde o início da pandemia em 2020. Evidentemente não é possível comparar os professores com os nobres deputados, pois os professores trabalham todos os dias e, boa parte, atuam em condições desfavoráveis. Por isso, muitas vezes atendem demandas escolares com seu próprio dinheiro. Como ocorreu nessa redefinição de ações pedagógicas com aulas remotas. Muitas docentes precisaram adquirir, em suaves prestações, notebook, impressoras e celulares para dar conta de sua nova tarefa. Caso diametralmente oposto dos congressistas.
O Deputado Federal Ricardo Barros, engenheiro e empresário, já foi prefeito de Maringá-PR, Secretário da Indústria e Comércio do Paraná, Ministro da Saúde no governo de Michel Temer e está no seu sexto mandato como deputado e, somente por este lamentável depoimento, aparece em destaque nacional.
Neste mandato, o nobre deputado acumulou 20 ausências das 229 sessões plenárias deliberativas até agora. Lembrando que desde março de 2020 as sessões são virtuais, conforme regista o site da Câmara dos Deputados. O nobre deputado utiliza um Imóvel funcional em Brasília-DF, desde agosto de 2015. Em 2019 seu gabinete gastou R$1.242.680,33. Em 2020 outros R$ 1.284.145,96 e até março de 2021 consumiu R$ 96.978,82.
Em entrevista à CNN Brasil, Barros afirmou: “Infelizmente, o Brasil foi abduzido pelas corporações. Não tem nenhuma razão para o professor não dar aula. O profissional de saúde está indo trabalhar, o profissional do transporte está indo trabalhar, o profissional da segurança está indo trabalhar, o pessoal do comércio está indo trabalhar, só professor que não quer trabalhar”. Se trabalhar de forma virtual é para o nobre deputado “não ir trabalhar” os deputados federais também estão atuando de forma virtual em condições muito mais vantajosas que os professores.
O professor não quer voltar para as aulas presenciais porque há evidentes riscos de contaminações e, por consequência, de óbitos diante desse longo período pandêmico.
O nobre congressista deveria ‘trabalhar’ no sentido de contribuir minimizando os impactos da pandemia propondo, por exemplo, ações de aquisição de vacinas com maior efetividade ao governo que lidera no congresso. Se considera a Educação como essencial e prioritária deveria explicitar também no orçamento. Não, pelo contrário. O orçamento da educação aprovado na mesma semana não trata a educação como essencial. Outro exemplo, poderia ‘trabalhar’ para que a verba do FUNDEB fosse corretamente encaminhada aos municípios e estados brasileiros. O que não aconteceu nos últimos meses de março e abril deste ano. Esses fatos são inéditos, nunca ocorreram desde seu início em 1998, quando essa sistemática do fundo de desenvolvimento e manutenção do ensino foi implantado. Esse descuido do governo federal afetou municípios e estados desequilibrando suas receitas na educação. Isso que é essencial. O líder do governo poderia ‘trabalhar’ contribuindo para que o MEC faça corretamente sua obrigação constitucional.
Cada governo tem o líder no Congresso Nacional que lhe convém. E sempre de acordo com seu nível de comprometimento no atendimento de Políticas Públicas de Estado como Educação, Saúde e Assistência Social.
Possível concluir que deputados e professores, em seus labore neste período de pandemia, somente tem em comum a atuação virtual. Os professores preocupados em fazer o seu melhor diante das dificuldades na evolução de aprendizagem de seus alunos nesse contexto de adversidade de condições que lhe são oferecidas em suas ações laborais e o líder do governo dizendo: “Não tem nenhuma razão para o professor não dar aula” para agradar o ‘chefe’.
Como sempre dizia Chico Anísio, na Escolinha do Professor Raimundo, e o salário, ó.
Essio Minozzi Júnior é professor de Matemática e pedagogo. Pós-Graduado em Gestão Educacional – UNICAMP; Planejamento Estratégico Situacional – FUNDAP- Administração Pública-Gestão de Cidades UNINTER; Dirigente Regional de Ensino DE Caieiras (1995-96), Secretário da Educação de Mairiporã (1997-2000) e (2017-2018), Vereador de Mairiporã (2009-2020)