Para além das perdas e saudades

Para os momentos de melancolia gosto de lembrar que a saudade é um sentimento que eterniza a presença de quem se foi. Ela não é apenas uma dor, mas também uma forma de manter vivo o que foi vivido, transformando a ausência em uma espécie de presença silenciosa.
Com o tempo, essa dor se aquieta e se torna um espaço de espera, onde a esperança de reencontro se mantém viva. Uma visão religiosa, eu sei, mas é a que eu gosto de alimentar. Cada um, busca o conforto da forma que lhe cabe para a mesma dor. A dor da ausência pela morte é algo que a gente nunca se acostuma.
A saudade é um lugar que só conhece quem amou, como diz a poesia da canção e sentir saudade também é transformador, já que o lamento pela ausência, pode ser um convite para valorizar mais os momentos vividos e as pessoas que fazem parte da nossa história. É um sentimento que nos ensina sobre a importância do presente e sobre como devemos aproveitar cada instante com aqueles que amamos.
O vazio no peito lembra que apesar da ausência, o vínculo permanece em quem ficou, já que o amor de verdade transcende o tempo e a distância. A filosofia também ensina que a saudade não deve ser vista apenas como um sentimento melancólico, mas como uma expressão do amor vivido. Ela nos conecta ao passado, nos ensina sobre o presente e nos prepara para o futuro, mostrando que, mesmo na ausência, o amor continua a nos acompanhar.
Um dos maiores medos que as pessoas costumam me contar é justamente o medo da morte. Medo de morrer! No meu caso era diferente. Os meus receios iam de encontro às ausências dos outros e não a minha. Sobre o que eu faria quando não pudesse mais ter algumas pessoas por perto. Só de pensar em algo assim, já tinha pavor.
Quando minha mãe foi ficando velhinha, eu observei o desconforto dela vendo as pessoas indo embora antes. Nos últimos cinco anos da sua vida, principalmente, teve que se despedir muitas vezes. Não passávamos muitos meses, sem que ela chorasse a falta de uma amiga ou de uma irmã. Quando não era isso, uma notícia de algum conhecido, principalmente em um lugar como a nossa cidade em um tempo que tudo é publicado nas redes sociais.
Eu gostava de acompanhar velórios, pois gostava de dizer que não tinha medo do defunto. Certo dia, vi o cortejo de um sepultamento no cemitério municipal e acompanhei. Como de costume, as pessoas lançavam cada qual um punhado de terra. Uma tradição que não sei o que significa, mas meu instinto travesso, fez com que eu pegasse o barro e amassasse na mão a parte úmida, de forma que ficasse firme, quase como uma pedra.
Lancei de modo proposital para cair sobre a urna roxa e por ser de papel, perfurou a tampa revelando as mãos do falecido. Fiquei apavorado de medo e assustado sai daquele lugar imediatamente. Não adiantou e a consciência pesou. Durante a noite, coberto até a cabeça, o sono não vinha e meus pensamentos eram de apavorado por ter feito a mão daquele finado aparecer e ser enterrado daquela maneira.
Naquele tempo até a morte era leve. Hoje, na maturidade, a saudade é doída como uma lança perfurando a carne e o exercício de organizar o luto, um desafio para gigantes. Saudade não vai embora, pois o amor verdadeiro não se desgasta e não se cansa.
Ao despertar para um novo dia, lá estão todos esses sentimentos misturados, basta um gatilho mental, que seja uma música, uma foto ou um lugar que tudo ressurge. Então lembro que bom mesmo é viver bem o caminho, sem se preocupar com a chegada, já que essa é inevitável e não há como saber o dia.

Luís Alberto de Moraes – @luis.alb – Autor do livro “Costurando o Tempo – dos Caminhos que Passei”