DRIELLI PAOLA
O fim de ano chega como quem pede a palavra depois de um longo silêncio. Ele não bate à porta com delicadeza – entra trazendo balanços, lembranças e aquela sensação estranha de que tudo passou rápido demais. De repente, somos convidados a revisitar os dias que vivemos, os planos que deram certo, os que ficaram pelo caminho e até aqueles que mudaram de forma sem que a gente percebesse.
Existe uma espécie de cansaço que só aparece em dezembro. Não é apenas físico. É um cansaço da alma, de quem sustentou mais do que podia, sorriu quando queria chorar e seguiu mesmo sem saber se era para onde queria ir. O fim de ano escancara isso. Ele ilumina as conquistas, mas também evidencia as perdas, os silêncios, as promessas que não se cumpriram – por nós ou pelos outros.
É curioso como, nessa época, o tempo parece dobrar sobre si mesmo. O começo do ano ainda está perto o suficiente para doer, e o próximo já acena com expectativas novas, listas de resoluções e aquela esperança teimosa de que “agora vai”. A gente se pega fazendo contas invisíveis: o que valeu a pena, o que ensinou, o que ainda precisa ser deixado para trás. Nem tudo cabe na mala do ano seguinte. E tudo bem.
Há também quem chegue ao fim do ano com a sensação de que ficou devendo algo à própria vida. Como se o tempo tivesse passado rápido demais e os dias não tivessem sido suficientes para tudo o que se sonhou. Mas o ano não cobra performance, ele revela processos. Nem sempre crescer é visível, nem sempre amadurecer é confortável. Às vezes, a maior mudança aconteceu por dentro, silenciosa, enquanto ninguém via – e isso também conta. Isso também é avanço.
Talvez o final de ano não seja sobre fechar ciclos com frases prontas ou rituais perfeitos. Talvez seja sobre reconhecer o que foi possível. Sobre aceitar que nem todo sonho floresce na estação certa, que algumas sementes ficam guardadas, esperando um tempo mais generoso. O encerramento não precisa ser grandioso. Às vezes, basta ser honesto.
Também há, no final de ano, um convite silencioso para a reconciliação. Não apenas com as pessoas, mas com a própria história. Aceitar que fizemos o melhor que podíamos com os recursos que tínhamos naquele momento. Que algumas escolhas não foram falhas, mas tentativas. Que sobreviver, em certos dias, já foi uma grande vitória. Olhar para trás com menos julgamento e mais compaixão talvez seja o maior fechamento de ciclo que podemos oferecer a nós mesmos.
O último mês do ano nos lembra que a vida não se mede apenas por resultados, mas por atravessamentos. Pelas pessoas que passaram, pelas versões de nós que nasceram e morreram ao longo do caminho. Encerrar o ano é, de certa forma, agradecer, até pelo que doeu, e permitir-se descansar da tentativa constante de controle.
E eu prefiro viver assim – sei que sou mais feliz desta forma… despedindo-me do ano com gentileza, sem cobranças excessivas, levando comigo apenas o que fez sentido. A você, caro leitor, desejo um final de ano com pausas, lucidez e um pouco de silêncio. Que você consiga soltar o que pesa, honrar o que ficou e abrir espaço para o novo não como obrigação, mas como possibilidade. Porque recomeçar, às vezes, é só continuar, com mais consciência e um pouco mais de cuidado consigo.
Drielli Paola – @drielli_paola. Servidora Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo. Bacharel em Direito, com pós-graduação e extensões universitárias na área jurídica. Entusiasta de psicologia, história, espiritualidade e causa animal. Apaixonada pela escrita.