Precisamos caminhar cumulativamente na direção correta, com menos solavancos
A semana que passou foi marcada pela revisão para baixo das expectativas de crescimento econômico no ano que vem. Na trajetória oposta das revisões para este ano, que começaram próximas a 3,5% e chegaram a atingir 5,3%, as projeções da pesquisa Focus para 2022 vem caindo de maneira consistente, de 2,5% para os 1,7% atuais. Muitos já trabalham com números entre 0,5% e 1%.
Tais projeções de baixíssimo crescimento refletem os ruídos e as incertezas na política e na economia, além da elevação da inflação e o esforço de política monetária que será necessário para cortar esse processo. Será um governo a entregar mais um quadriênio de crescimento inaceitável.
Há, porém, que se contextualizar a situação. A maior pandemia dos últimos cem anos certamente tem muito peso neste saldo, e, até por isso, talvez seja importante nos comparar com alguns de nossos pares. Segundo os últimos dados disponibilizados pelo FMI, a média do crescimento do Brasil no biênio 2019-20 foi de -1,4%, frente a -3,4% para a América Latina e -0,3% para o mundo. Aceitando as projeções para 2021-22, o ciclo se completará com uma média de 1,1% para o Brasil e 0,6% e 2,6% para América Latina e Mundo, respectivamente.
São comparações imperfeitas, mas podemos dizer que, no campeonato de mediocridade que tem marcado as últimas décadas latino-americanas, fomos menos medíocres nos últimos anos, o que nem sempre foi verdade. É circunstancialmente positivo, ainda que um sarrafo baixo para o Brasil. Já do mundo, perdemos há quatro décadas.
Ao fim e ao cabo, será um quadriênio que se encerrará com crescimento pífio e próximo à velocidade que a economia brasileira tem conseguido manter nos últimos anos (1%-2%). Se lembrarmos que, em 2015/16, fomos capazes de produzir uma recessão de quase 7% por nossas próprias mãos e que, em 2021, estamos cogitando implementar uma “reforma” tributária que reduz a produtividade da economia, talvez a discussão sobre o que teria ocorrido na ausência da pandemia se revele menos determinante…
É clara, há de muito, nossa dificuldade em implementar uma agenda de crescimento para a economia brasileira. Com o fim do bônus demográfico, nossa inoperância e inabilidade cobrarão um preço cada vez mais alto.
Infelizmente, parece que vamos, mais uma vez, nos perder nos debates vazios e cansativos entre o “liberalismo” e o “desenvolvimentismo” tupiniquins, ambos com planos “revolucionários” para virar o Brasil do avesso. O que precisamos é caminhar paulatina e cumulativamente na direção correta, com (muito) menos solavancos. Foi assim que fizeram os países bem-sucedidos.
Antônio Delfim Netto: Economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”