Eschaton

Uma das grandes curiosidades de quem vive é saber o que acontece depois que esse tempo acaba. Naturalmente a minha visão escatológica é a católica, como você já deve saber caro leitor. Para mim, sem dúvida a que mais oferece conforto para a ausência que a irremediável morte carrega. Nela encontro não apenas uma promessa de eternidade, mas uma lógica divina que acolhe o sofrimento humano.
A fé católica não nega a dor da separação, mas a envolve em sentido: a cruz que um dia foi símbolo de fim, tornou-se sinal de recomeço. E é justamente nesse mistério da ressurreição que o coração encontra abrigo. Saber que a morte não é destruição, mas passagem, transforma o desespero em esperança silenciosa.
A escatologia cristã, mais do que um ensinamento, é uma forma de consolo. Ela recorda que a vida não termina no túmulo, mas floresce em outro jardim, invisível aos olhos e, ainda assim, profundamente real. Essa visão alimenta o espírito quando as ausências se fazem gritantes. Nos dias em que a saudade aperta, é reconfortante pensar que o amor não morre, apenas muda de endereço.
O homem, limitado pela razão, busca compreender aquilo que pertence ao campo do mistério. E é nesse ponto que a fé se torna necessária: ela é o que ultrapassa o entendimento humano e alcança o impossível. Sem ela, a morte seria um abismo sem ponte; com ela, transforma-se em travessia. Não há ciência ou filosofia que consiga oferecer tamanha serenidade diante do fim quanto a certeza de um reencontro prometido.
Costumo pensar que Deus, em sua sabedoria, nos deixou as incertezas para que aprendêssemos a confiar. Se soubéssemos tudo, a fé não teria valor algum. O desconhecido é, portanto, um convite à confiança, um exercício de entrega.
E cada vez que alguém parte, é como se o céu se abrisse um pouco mais, lembrando-nos de que há um lar que não se mede pelo tempo, nem se encerra na matéria.
A religião, em sua essência, existe para amparar o espírito humano diante do incognoscível. É o lenço que enxuga o pranto dos que ficaram, a mão invisível que toca o ombro e diz: “há sentido, mesmo que você ainda não veja”. É nessa mensagem que repousa o maior poder da fé: transformar o medo do fim em aceitação serena.
E quanto mais maduro, mais compreendo que a vida é apenas um ensaio da eternidade. Vivemos provisoriamente, amando com urgência e partindo devagar. O corpo se vai, mas o que fomos, o amor que demos, as bondades que deixamos. Isso permanece no mistério divino, guardado em algum lugar onde o tempo não alcança.
Talvez seja por isso que os que creem caminham com mais leveza. Carregam a certeza de que nenhum adeus é definitivo, e que o silêncio do túmulo é apenas o intervalo antes de uma nova canção. E, ao final, quando também formos chamados a atravessar, que possamos fazê-lo com a paz de quem compreendeu que a morte, afinal, é apenas a porta que se abre para a vida em plenitude.

Luís Alberto de Moraes – @luis.alb – Autor do livro “Costurando o Tempo – dos Caminhos que Passei”