Cuidado: essa crônica contém afeto em excesso

Há dias em que o mundo está tão áspero que qualquer gesto de carinho parece quase um ato de resistência. Talvez por isso eu precise deixar o aviso logo no começo: essa crônica contém afeto em excesso. Se você anda com o coração meio desbotado, talvez escorra um pouco de cor pelas bordas.
É que, ultimamente, tenho pensado muito sobre o tamanho das coisas. Não o tamanho físico, mas o emocional. Tem gesto pequeno que carrega um mundo inteiro dentro dele. Um copo d’água deixado ao lado da cama. Uma mensagem dizendo “chegou bem?”. Um silêncio confortável de quem entende sem explicação.
Afeto é isso: uma delicadeza que não pede palco, mas muda o cenário inteiro.
Talvez a gente subestime o poder dessas pequenas delicadezas. Um gesto simples, quase distraído, pode mudar o humor de uma manhã inteira. Uma frase dita na hora certa, um elogio sincero, um convite para respirar um pouco. É impressionante como esse cuidado miúdo, que não pede reconhecimento, ajusta a alma no lugar. Às vezes, é só disso que a gente precisa para continuar.
Só que a gente anda vivendo numa era em que sentir virou quase um constrangimento. As pessoas se protegem tanto, escondem tanto, endurecem tanto, que demonstrar cuidado parece um escândalo.
Mas eu, sinceramente, acho que o problema nunca foi excesso de afeto. Foi a falta. Porque afeto não pesa. Não invade. Não cobra. Afeto sustenta – e sustenta bonito.
Tem gente que acha que ele vem só dos grandes amores, das relações épicas, dos romances que enchem páginas e feeds. Mas não: afeto é democrático. Ele aparece num abraço inesperado de amigo, numa avó que corta a fruta com amor, num colega de trabalho que percebe seu cansaço antes mesmo de você confessar. Na amiga que sempre te manda um bom dia com fotos muito charmosas das viagens que faz. No amigo que te manda um meme só para te ver sorrir. No cachorro que encosta a cabeça no seu joelho como quem diz “tô aqui”. No parceiro que ajeita a coberta sem fazer barulho. Nas pessoas queridas que leem essa coluna e me respondem com carinho.
Afeto é quando alguém te vê, de verdade, mesmo quando você tenta disfarçar que está tropeçando por dentro. E talvez seja por isso que eu decidi escrever essa crônica como quem estende um cobertor no fim da tarde: para lembrar que sentir não é fraqueza. É vida em estado bruto. É coragem.
A verdade é que o mundo não está sofrendo por excesso de afeto. O mundo está precisando de reparo – e o reparo começa pelas pequenas gentilezas que a gente distribui quase sem perceber. Por isso, se essa crônica carregar demais no carinho, me perdoe. Ou melhor, aceite. Ela é um lembrete, não um exagero.
E eu prefiro viver assim – sei que sou mais feliz desta forma… escolhendo o afeto sempre que posso, como quem acende uma luzinha mesmo em dias nublados. E a você, caro leitor, desejo que o afeto encontre seu caminho até você, de mansinho, sem alarde, e transforme pelo menos um pedaço do seu dia.

Drielli Paola – @drielli_paola. Servidora Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo. Bacharel em Direito, com pós-graduação e extensões universitárias na área jurídica. Entusiasta de psicologia, história, espiritualidade e causa animal. Apaixonada pela escrita.