Adeus fevereiro velho

Pelo menos até o século primeiro antes de Cristo, no mundo romano o ano se iniciava no primeiro dia de março. Júlio César é que mudou as coisas e desde então, dezembro não é mais o mês dez. Por já ter sido o último mês do ano, fevereiro é o mais curto; afinal já serviu para ajustar o calendário. Curioso e estranho chamar novembro de mês onze. Demorei anos para entender. Fora que quando criança, gostava de brincar com a sequência que me parecia mais lógica para os dias da semana, chamando o sétimo de sábado-feira.

Sem delongas, está difícil falar tanto de pandemia e big brother. Estou com saudade mesmo é de uns fevereiros antigos que a gente sentava e falava mal só de quem merecia. Da rua dos Expedicionários, vez em quando dava para ver a lanterna de algum veículo que descia a Fernão Dias quase deserta tarde da noite. No Esporte Clube a matinê era concorrida no carnaval e Mairiporã quase que era mesmo o paraíso ao pé da serra cantado por Athos Campos.

Parei com a nostalgia, já que não quero uma vibe melancólica para mim e para você: leitor fiel do Correio, que já foi só Juquery e que toda semana chega a milhares de pessoas; seja pelo cheirinho do papel jornal ou na tela dos smartphones e computadores. Dessa vez, quero mesmo é que façamos desse março, motivo de parecer que ainda é o primeiro mês do ano. Que possamos abrir a janela de casa e da alma para que esse ano novo seja mesmo esse começo de algo que veio para ser melhor que antes e que tudo de ruim, tudo de tristeza, tudo de doente, possa ir embora sem que leve de nós essa satisfação danada de se embriagar com a simplicidade de uma boa conversa.

Que essa prosa tenha pitadas de ironia e que o sarcasmo não ultrapasse o azedume a ponto de nos deixar invejosos. Que a gente conte uma história e ria tanto que as bochechas fiquem doendo e que seja difícil contar até o final, de tanto que a lembrança do fato nos provoque gargalhadas incontroláveis. E que essas gargalhadas sejam ouvidas até na rua de cima, para que ouvidas, convençam que o autor está engasgando de tanta felicidade.

Que a curiosidade dessa alegria desperte um sentimento ao menos otimista, para que no dia seguinte o otimismo se torne o entusiasmo que a gente conquista quando acorda com vontade de fazer a vida dar certo com leveza e generosidade. Assim, quando as águas de março fecharem o verão, que nos traga razões de ir em frente para uma próxima e próspera estação.

 

Luís Alberto de Moraes tem formação em Letras, leciona há quase vinte anos e prepara o lançamento de um livro de crônicas e poemas. @luis.alb