“O oposto da coragem não é a covardia, é a conformidade.” (Rollo May)
O uso de medicamentos para lidar com estresse, ansiedade e burnout disparou entre trabalhadores brasileiros em 2025. Pesquisa realizada pela The School of Life, em parceria com a Robert Half, aponta que 52% dos líderes e 59% dos funcionários recorreram a remédios desse tipo, contra apenas 18% e 21% em 2024.
O curioso é que, mesmo diante do aumento expressivo, o tema permanece cercado de silêncio. Quase 3 em cada 4 gestores preferem não revelar às suas equipes que utilizam medicamentos, índice que cai para 33% entre colaboradores de níveis hierárquicos mais baixos. A lógica parece clara: quanto mais alto o cargo, menos se admite a própria fragilidade, ironicamente, 56% desses líderes afirmam que suas empresas incentivam práticas de acolhimento emocional.
O fenômeno acompanha uma escalada nacional. Entre 2013 e 2023, os atendimentos de saúde mental na rede pública (SUS) dobraram, passando de 13 milhões para 26 milhões. No mesmo período, cresceu mais de 50% o uso de antipsicóticos, utilizados para tratar depressão, ansiedade, transtorno bipolar e esquizofrenia. Curiosamente, apesar desse cenário, apenas 40% dos trabalhadores brasileiros relatam sentir estresse, número abaixo da média global.
Mais do que estatísticas frias, esses números refletem uma realidade que muitos reconhecem no dia a dia: aquela sensação de cansaço constante, a pressão por metas inalcançáveis, a dificuldade de desligar do trabalho mesmo fora do expediente.
Quantos de nós já sentimos que precisávamos “segurar a onda” com remédios para cumprir a rotina de 8h às 18h, fora a faculdade, casa etc.? Quantos já se sentiram sozinhos ou sem espaço para falar sobre cansaço emocional?
O quadro revela um alerta: o trabalho moderno cobra um preço alto da saúde mental, e o uso de medicamentos se tornou uma forma de sustentar a produtividade. Mais do que números, trata-se de um convite à reflexão sobre a nossa cultura que prioriza resultados imediatos em detrimento do bem-estar.
Reflexão – É hora de repensar o ambiente de trabalho no Brasil, mas principalmente no meio em que atuamos e convivemos. Empresas, gestores e sociedade precisam criar espaços mais humanos, que incentivem cuidado, diálogo e equilíbrio.
Afinal, a produtividade só se torna verdadeiramente sustentável quando o bem-estar dos trabalhadores é respeitado e quando admitir fragilidade deixa de ser tabu porque cuidar da mente não é luxo, é sobrevivência e qualidade de vida.
Raphael Blanes é Servidor Público Municipal, formado em Gestão em Saúde Pública, Técnico em Vigilância em Saúde com ênfase no Combate às Endemias, especialista em Gestão Hospitalar, graduando em Filosofia e Psicologia. Instagram: @raphaelblanes Email: blanes.med@gmail.com.