Legião Urbana: canções que viraram orações

Há bandas que passam. E há bandas que permanecem. A Legião Urbana é dessas últimas: não apenas marcou uma geração, mas atravessou o tempo e continua ressoando como se tivesse acabado de nascer. Não é só rock. Também não é só poesia. A Legião Urbana é aquilo que a gente não sabe classificar, mas sente. São letras que falam de amor e de dor, de esperança e de desencanto, de política e de fé. Canções que se tornaram orações urbanas, cânticos de um Brasil que ainda tenta se entender.
Desde os anos 80, sob a liderança intensa e inquieta de Renato Russo, a banda construiu sua identidade na mistura de lirismo e crítica social. Falava ao jovem, mas também ao adulto; ao apaixonado e ao descrente; ao que acreditava e ao que duvidava. Tudo cabia na poesia de Renato: de “Pais e Filhos” à “Índios”, de “Tempo Perdido” a “Monte Castelo”. Suas músicas pareciam cartas abertas, onde cada verso era um espelho em que milhares de pessoas se viam refletidas.
A Legião Urbana não foi apenas um grupo musical, mas um movimento de pertencimento. Em seus shows, o público cantava junto como se estivesse numa missa laica. Não havia apenas plateia, mas havia uma comunidade. A cada acorde, um manifesto. A cada refrão, uma declaração de resistência. Em suas letras, encontramos a desigualdade social e a solidão das cidades grandes, o amor que cura e o amor que fere, a fé que consola e a ausência de fé que dói. Tudo era matéria-prima. E talvez por isso suas canções sigam vivas, porque tocam em verdades universais e em sentimentos que não têm prazo de validade.
Ouvir Legião Urbana é também um exercício de memória afetiva. Cada música carrega histórias pessoais. Quem nunca chorou com “Pais e Filhos”? Quem nunca acreditou que “é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã”? Quem nunca se sentiu parte de algo maior ao cantar “Que país é este?” em uníssono com uma multidão? Cada verso é um retrato coletivo, mas também uma confissão íntima.
Tive a sorte de conhecer a banda ainda na infância. Apesar de ter consciência das músicas quando a banda já não tocava mais e seu líder já havia desencarnado, suas canções foram parte da trilha sonora da minha juventude e continuam sendo companhia até hoje. Não há como não sentir um arrepio quando começa o primeiro acorde de “Tempo Perdido”. É como se uma janela se abrisse dentro de nós, lembrando que a vida, com todas as suas dores, ainda vale a pena ser vivida.
A Legião Urbana é um lembrete de que a arte pode ser bruta e delicada ao mesmo tempo. Que pode denunciar e consolar, confrontar e abraçar. Uma banda que já não existe fisicamente, mas que continua presente em cada coração que se emociona ao ouvir suas músicas. E talvez esse seja seu maior legado: provar que a poesia, quando é verdadeira, não morre nunca.
Eu prefiro viver assim, sei que sou mais feliz desta forma… com o coração aberto para sentir a intensidade que a Legião Urbana ainda me proporciona. E a você, caro leitor, desejo que também se permita revisitar essas canções – não apenas como músicas, mas como pedaços de vida, lembranças coletivas e versos que ainda hoje nos ajudam a respirar.

Drielli Paola – @drielli_paola. Servidora Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo. Bacharel em Direito, com pós-graduação e extensões universitárias na área jurídica. Entusiasta de psicologia, história, espiritualidade e causa animal. Apaixonada pela escrita.