Mortandade pela COVID 19 sugere a prática da necropolítica

O Estado é uma entidade que comanda e organiza a vida em sociedade. A atuação do Estado Brasileiro nesta pandemia vem sendo criticada diante da ‘lentidão’ nas iniciativas de combate ocultando, supostamente, uma intencionalidade.

Atitudes sem objetividade e decisões fundamentais desprezadas levam a suscitar o verdadeiro proposito dos responsáveis pela gestão do Estado Brasileiro e, também, em outras nações.

Após um ano o Brasil acumula mais de 360 mil óbitos por Covid 19 com a aceleração de casos e óbitos nas últimas semanas. A OMS esperava por lockdown. A população dependente do auxílio emergencial ficou sem retaguarda nos três primeiros meses de 2021. O Brasil deixou de ter 70 milhões de doses da Pfizer em dezembro de 2020 quando, em agosto, recusou a proposta alegando questões contratuais, mas a União Europeia e países com Estados Unidos, Japão, Israel, Canada, Reino Unido, Austrália, México, Equador, Chile, Costa Rica, Colômbia e Panamá entre outros firmaram contrato com igual teor e começaram a imunizar suas populações bem antes. Agora busca contratar a vacina desprezada no ano passado.

Proporcionalmente ao número de habitantes, o Brasil é o 57º pais no ranking da vacinação mundial. Até a última terça feira 11% foram vacinados com a 1ª dose e 3% com a 2º dose. O Brasil tem o PNI-Plano Nacional de Imunização de combate ao coronavírus, mas não tem as vacinas para agilizar a imunização da população. O orçamento da Saúde para 2021 é inferior em R$ 20 bi ao valor gasto em 2020. O Senado avaliou na última terça feira a abertura de uma CPI da COVID para investigar a atuação governamental.

A mortalidade por Covid-19 na rede pública de saúde é o dobro daquela da rede privada. Especialistas brasileiros informam que os mais pobres, os negros e pardos, os sem escolarização e residentes nas periferias das cidades, com baixo acesso a saúde públicas, com empregos e subempregos distantes das residências obrigando-os a utilizar diariamente transporte público superlotados, se expõem muito mais e tornam-se mais vulneráveis as contaminações e, por consequência, vão a óbito em maior quantidade.

Surge neste momento pandêmico, na narrativa controladora do sistema, os chamados ‘invisíveis’ que fora do sistema econômico formal, mas presentes no dia-a-dia em busca de sobrevivência periférica. Tais ‘invisíveis’ se acumulam nos cemitérios que, recentemente, passaram a realizam sepultamentos noturnos.

A desigualdade social está em destaque também em outros países capitalistas, como Reino Unido e Estados Unidos.

Como pano de fundo nessa mortalidade pandêmica estão um segmento social vítimas das desigualdades sociais desse sistema que naturaliza o racismo, as condições sanitárias das localidades com moradias inadequadas onde habitam os mais pobres se sujeitando a acesso desigual aos sistemas de saúde.

Estudos da USP constatou nas 30 mil notificações analisadas no cruzamento dos dados de raça e escolaridade, 80,35% pretos e pardos sem escolaridade foram atingidos pela doença e brancos com nível superior foram apenas 19,65% dos casos, revela o médico sanitarista e professor de saúde pública, Dr. Gonzalo Vecina Neto.

Esse histórico de desassistência a essa população vem de longas datas e é do conhecimento do Estado Brasileiro que, até então, não são contemplados por políticas públicas de emprego e renda efetivos,

Bem como, sabe-se que a pandemia vem matando milhares de pessoas algum tempo e, mesmo assim o Estado Brasileiro deixa de cumprir com seu dever constitucional na garantia da saúde a toda população. Desta forma, possibilita a morte de brasileiros, na sua maioria essa população historicamente mais afetadas.

Esse procedimento se encaixa no conceito que o filósofo camaronês Achille Mbebme denominado necropolítica: “O Estado define quem deve viver e quem deve morrer”.

Essa atroz negligencia e proposital descaso no combate da pandemia, aniquiladora de vidas e produtora de vítimas com sequelas irreparáveis para o resto da vida, merece julgamento para se fazer justiça. As famílias enlutadas merecem respeito!

 

 

Essio Minozzi Júnior é professor de Matemática e pedagogo. Pós-Graduado em Gestão Educacional – UNICAMP; Planejamento Estratégico Situacional – FUNDAP- Administração Pública-Gestão de Cidades UNINTER; Dirigente Regional de Ensino DE Caieiras (1995-96), Secretário da Educação de Mairiporã (1997-2000) e (2017-2018), Vereador de Mairiporã (2009-2020)